Trago nos olhos as chuvas deste dia. Hoje que chovem lamentações de ninguém, serei eu o guardião dessas preciosidades densas…
Trago nos olhos o reflexo da alma. Uma alma pantanosa de tantos rostos e de tantas emoções que invadem o mesmo corpo que a abriga.
Sou um todo. Um todo feito dos nadas que sobram das intempéries das forças vagabundas que proliferam por caminhos cruzados do meu ego.
É este o meu mundo. O mesmo mundo que é nosso, de todos e de ninguém…
Trago densidades minhas misturadas que me confundem e inebriam o olhar.
Hoje chove e molham as palavras que solto. As próprias palavras ganham vida e formam-se em chuva. Há um mistério que nos faz pensar. Que nos empurra cada dia.
Resta-me um silêncio aprisionado dentro de mim, na espera dos dias por acontecer. É hoje que a chuva lava o meu rosto. Rosto feito das palavras, da chuva que cai…
Amanhã outro olhar, outro rosto e outra alma sentirá o mesmo, tudo o que senti depois de alguém já o ter sentido também. Acontece. Como a chuva que se repete…
3 comentários:
Um texto poético que me conduziu a reflectir sobre palavras que habitam num mundo muito feio.
1.º Que bom seria que este mundo, que é de todos e não é de ninguém, não fosse apenas dos poderosos. A mim cabem-me apenas os sobejos deles.
2.º Que bom seria que a chuva, que hoje molha as suas palavras, molhasse as palavras daqueles que as usam de forma suja. Talvez molhadas elas ficassem lavadas, cândidas, despretensiosas…
3.º Que bom seria que a chuva de hoje pudesse fazer brilhar nos olhos de alguns, reflexos de uma alma mais genuína, mais profunda, mais humana, mais verdadeira…
Muitas vezes as suas prosas poéticas põem-me a deambular por caminhos sem fim, caminhos que, provavelmente, se chegam a afastar das intenções das suas palavras. Um texto que me conduza, nem que seja apenas a uma reflexão é sempre maravilhoso.
A escrita do Paulo provoca em mim esse efeito. Obrigada.
Como forma de agradecimento, deixo-lhe um bocadinho do que escrevi já há algum tempo atrás.
PALAVRAS À CHUVA
Por entre a chuva passam palavras
que ficam transparentes
e que espelham tudo o que me envolve.
Ou ficam negras e toscas
ofuscando o que sinto.
Quero pintá-las de branco
da cor da lua e da cal
mas o branco da paleta sumiu.
(…)
Um abraço
MV
Olá amigo Paulo
Perdoe-me pela grande ausência. Penso muito em si e irrito-me. Porquê? O meu computador de 1997 "já foi à vida". Não conseguia, com ele, entrar nos seus comentários. O meu filho ofereceu-me um com 80GB. Mas ainda não sei publicar a foto nem linkar os meus preferidos, por exemplo. Estou a aprender a trabalhar com isto.
Não digo nada sobre o seu magnífico texto poético. A Marta já se antecipou, tirando-me a maior parte das palavras.
Desejo que esteja tudo bem consigo.
Um grande abraço.
António
Trago a vontade de guardar as palavras que escreves. De as apanhar, como se de gotas de água se tratasse, e de as conservar por perto, para as ler sempre que me apetecer :-)
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