Atravesso
diariamente esta ponte. Confesso que é uma ponte apelativa a alta velocidade.
Por isso, na maioria das vezes, a faixa que uso é a da esquerda. Mas também
tenho dias em que vou muito cedo, ou melhor, sem qualquer pressa, e então uso a
faixa da direita (excepto para ultrapassar) o que me permite desfrutar da
magnífica paisagem. Pela manhã há a movimentação dos pescadores e o céu é um
quadro desenhado a gosto onde, muitas vezes, a lua ainda é o destaque.
Regressar
a Lisboa, ao fim do dia, é digno de se ver. Há um pôr-do-sol encantador e uma
cidade linda à nossa espera.
E é nestas ocasiões, ou
passeios pela ponte, que, muitas vezes, reparo nos veículos que se “colam” à
faixa do meio. Independentemente da velocidade, do trânsito ou da paisagem,
atravessam a ponte sempre na mesma faixa: andam na do meio – porque é no meio
que está a virtude, tal como a velha máxima nos ensina.
O que não sabem, até
porque não há nenhuma máxima sobre este tema, é que não facilitam a sua vida,
nem a dos outros, com este tipo de condução. Também não sabem ou não se lembram
que esta permanência na faixa do meio é perigosa porque, em caso de acidente, a
capacidade de manobra e de evitar novo acidente é menor para os outros
condutores.
De facto, a ponte é
agradável e eficaz. Mas é como tudo na vida, tem um lado positivo e um
negativo. Lembro-me das portagens, outra coisa inflacionada, e cada vez mais
impessoal, com máquinas que nos levam o dinheiro, de uma forma educada – e que
até nos dão ordens e desejam uma boa viagem –, mas que substituem vários postos
de trabalho.
Um dia, também esta ponte
mudará de nome e será tão vulgar como a outra, ninguém se recordará da famosa
feijoada da inauguração e das corridas nocturnas que ali amiúde ocorrem.
Um dia… um dia, em vez de
duas, serão três as pontes sobre o Tejo e mais alguém estará a enriquecer
graças a mais um megalómano contrato bem conseguido e que nós, os utilizadores,
pagaremos dia-a-dia com a nossa passagem, independentemente da faixa ou da
velocidade que usemos, ou da paisagem de que usufruiremos. O tempo passa, mas
as realidades repetem-se, com maior ou menor intensidade e de nada adianta
criticar; por isso, continuem a andar na faixa do meio e nas correrias loucas,
que eu continuarei a passar pela ponte Vasco da Gama para ver o pôr-do-sol ou
para olhar para a minha querida Lisboa com os olhos de um eterno apaixonado.
Afinal, é o lado bom da vida que mais interessa, não é?
E a ponte nunca deixará de
ser «uma passagem para a outra margem».
Paulo Afonso Ramos
(Editor da Lua de Marfim)
Publicado no Jornal
(Dezembro 2011 - Edição n.º 3 | Ano I)
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