domingo, janeiro 18, 2009

Carta a quem lê

Carta a quem lê...


Sou o que resta de mim, mas ainda a tempo para que vos comunique o meu último passo, que dou com uma mão ferida e um coração esmagado nas palavras que escrevo.
Os últimos dias que arrastei foram deixando cair as minhas personagens num marasmo inexplicável. Num sofrimento escondido, foram morrendo, uma após outra, de causas tão naturais, como o frio que ainda mata, ou como o medo que aterroriza e nos leva a loucura, ou ainda de falta de afecto, outra causa tão intensa como as anteriores. Várias razões foram acontecendo. Os meus dias foram apagados a pressa por não serem vividos. Tudo foi acontecendo num descalabro imprevisível e urge que essa consciência seja partilhada. Sei que, independentemente das causas, as personagens ficaram silenciadas primeiro, para depois receberem o golpe misericordioso, para que, num acto final, morressem na solidão dos meus actos.
Não. Não fui eu que as matei. Limitei-me apenas a assistir, sem que nada fizesse para evitar este trágico desfecho.
Resta-me um pedaço de mim em desgraça e um olhar que segue as palavras que também arrasto num sofrimento atroz, uma dor que deixa em mim um flagelo que me faz desejar e antecipar o meu próprio fim.
Não escreverei mais, e, desta despedida, fica um passado exposto em que posso recorrer para ler os meus dias, as minhas fantasias e os meus sonhos. Que leia quem quiser, que seja o que for, ninguém mudará o que aconteceu. Vivi cada frase com paixão, deixei-me em cada folha e entreguei-me de corpo e alma à emoção e a cada momento que criei. Mas cheguei ao final. Tudo é um ciclo e este fecha-se hoje, sem que antes, e nas minhas últimas forças, vos agradeça todo o apoio que foram dando nas visitas aos meus escritos ou nas mensagens que foram escrevendo.
Sobra-me a pessoa, projecto em ebulição, para que o caminho se faça em consciência e em linha recta, numa entrega total e em prol do próximo.
Grato por terem existido nas loucuras do meu imaginário e por serem tão reais quanto vos assumi, na brandura das minhas frases em que nunca se agigantaram.
Sois o melhor que levo. O melhor que guardei nas peripécias das letras que, um dia, iniciei. Por vós, sobra-me uma saudade, quase como a chuva miudinha que não é tão intensa mas que é constante e que deixa o mesmo efeito que outra chuva qualquer que seja mais e maior. Guardo-vos em mim, na parte que nunca morrerá. Até sempre!

3 comentários:

Anónimo disse...

Interessante espaço. Vai uma visita a poemar-te? Tudo de bom.

Fatima disse...

Voltarás a carregar baterias para muito mais "investidas" ao que mais queres... e desejas!
Aguardo...Bjo
Fatima

Marta Vasil (pseud.de Rita Carrapato) disse...

Paulo

Parece um texto de despedida relativamente às muitas personagens que durante um ciclo habitaram em si e, consequentemente, nas suas palavras.
A dar alma a outras personagens ou apenas a dar alma à pessoa/Paulo, espero em breve voltar a lê-lo, com o entusiasmo e com as reflexões que as suas palavras sempre me fizeram fazer.
A vida é mesmo feita de ciclos. Morrem uns para renascerem outros, não é?

Um beijinho

MV